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  • Writer's pictureJosely Carvalho

Diário dos Cheiros: Covid19 (01)

Updated: May 26, 2020

28.04.20

Acabo de ler um texto da educadora Yvone B. de Mello e além de ser pessoal e informativo me identifiquei com vários dos momentos que ela passou com o Covid19 em seu corpo. Tem sido muito claro que este camaleônico nano-virus toma formas diferentes para cada um dos afetados. Não tem um padrão - somente o medo faz parte de todas as suas formas de invasão ao corpo em dor. Me faz lembrar o maravilhoso livro The Body in Pain de Elaine Scarry. A única certeza que vivi nestas 4 semanas foi a incerteza. A incerteza característica do corona virus e a incerteza do momento que vivemos e que não conhecemos. Ele entrou em mim em silêncio e sem cheiro que pudesse me prevenir do perigo. Primeiro sintoma foi a perda do olfato e do gosto e com ele desejo e prazer de comer. Perverso. Comia e bebia água porque sabia que necessitava.

Eram sopas sem gosto e tempero. Ele passou por mim lentamente. O cansaço, as dores no corpo, uma pequena manifestação do ouvido esquerdo, a febre baixa e o desejo de continuar trabalhando sabendo da impossibilidade. Somente um dia a febre me fez suar e o medo me consumiu por algumas horas. A respiração de meditações simples ajudavam. Mas o medo sempre voltava e a ansiedade foi aumentada pelos problemas da internet que levaram duas semanas para serem resolvidos. Logo depois meu macbook começou a rejeitar a internet. Será que o Covid19 pode invadir os processadores? ou foi algum outro virus adquirido nos momentos de afeto com familia e amigos/as no Zoom? A incerteza pode criar uma certa paranoia. Agradeço minha irmã Jocy de Oliveira que ouviu diariamente os graus da minha febre. Agradeço também meu filho e amigas que me ligaram constantemente me monitorando.


O mais doloroso foi perder o olfato. Foi desesperante não poder sentir os cheiros que acabava de criar para a minha adiada instalação Entre os Cheiros da História no Pátio dos Canhões do Museu Histórico Nacional. Naquele inicio do novo corona não se falava da perda do olfato como o primeiro sintoma do Covid19. Hoje discutem que pode ser um sinal que o teste deve ser administrado para evitar o contagio.


A instalação estabelece diálogos através do olfato entre a coleção de canhões e o público; entre o ontem e hoje. Nela, desenvolvo uma obra visual para não ser vista mas sentida.

Poderia o nariz ser considerado uma arma poderosa dos afetos, emoções e memórias?



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